Apontamentos sobre a importância da “música gaúcha” para o
tradicionalismo e vice-versa
Por Francisco Carlos Fighera ,
2º Vice Presidente da CBTG
(Tema sugerido por Odila Savaris).
Buenas e peço licença para
me arriscar a escrever sobre este tema, sobre o qual há poucas e restritas
pesquisas e escritos, também quase esquecido ou sob o silêncio dos acadêmicos,
mormente no Rio Grande do Sul, ao contrário de outros gêneros musicais (também
importantes) estudados principalmente nas regiões nordeste e sudeste. A música
faz parte da “atividade artística”,
uma das “atividades” que cobrem o
galpão do tradicionalismo e lhe dão sustentabilidade (vide artigos sobre a “sustentabilidade do tradicionalismo gaúcho”,
publicados neste espaço da CBTG, nas edições de junho e julho de 2012). Sem a pretensão de definir a “música
gaúcha” ou “música gauchesca”, entendo-a como a cantada em versos rimados,
embalada pelos ritmos do sul, entre o quais se destacam a vanera (vanerão),
rancheira, xote, chamamé, bugio, milonga, chamarra (chamarrita), canção, valsa.
Esses ritmos, exceto o bugio (de origem totalmente gaúcha), oriundos e/ou com
influência europeia ou latino-americana, foram aceitos, adaptados e miscigenados
pelos gaúchos. Já o verso gaúcho, gerado na alma, da semente da inspiração,
fecundado com rimas e acordes no cio da emoção, fala do pago, da pampa, dos
costumes, da terra, das plantas, dos animais, das revoluções, dos pássaros, do
céu azul, das prendas, do amor pelo Rio Grande, etc. É fruto do “tipo social”
do gaúcho, descrito por Barbosa Lessa em seu livro “Nativismo: um fenômeno
social gaúcho”. Ritmo e verso se ajoujam e se amadrinham. A meu ver há uma
fronteira imaginária e tênue (que não separa) entre a “música gaúcha” antes e depois da criação do movimento tradicionalista gaúcho (1947) e do
“35 CTG” (1948). Barbosa Lessa vai mais longe e no
mesmo livro “Nativismo: ...” cita o gauchismo
de Cezimbra Jacques em 1889, o regionalismo
por volta de 1920, o tradicionalismo
em 1947 e o nativismo a partir da
década de 70. Sem adentrar na discussão ou mérito da divisão feita por
alguns folcloristas e pesquisadores respeitados, entre música tradicionalista,
nativista, regionalista, penso que todas essas formas de expressão musical
foram e são importantes para a evolução do tradicionalismo, assim como a
recíproca é verdadeira. O tradicionalismo serviu /
serve de mote, motivação, inspiração, para que milhares de compositores,
músicos e artistas, cantassem / cantem seu amor pela “Querência Amada”, pelo
“Céu, Sol, Sul, Terra e Cor”, por sua terra natal (Canto Alegretense, Erexim
História e Canto), pelos costumes e por tantas outras coisas que o gaúcho
valoriza e enaltece, como a querência, a natureza, os animais, as mulheres, os
heróis, etc. A importância da “música gaúcha” para o tradicionalismo e
vice-versa, no nosso entender está relacionada a três aspectos: (i) aceitação: é fato notório que a
“música gaúcha” foi / é aceita pelos gaúchos e tradicionalistas de todas as
querências, mais os simpatizantes da tradição e do tradicionalismo, dentro e
fora das divisas do Rio Grande do Sul. Basta olhar para as milhares de músicas
gravadas (que movimentam a indústria fonográfica), os inúmeros programas de rádio,
as centenas de compositores, músicos e grupos (bandas) gaúchos que se formaram,
principalmente nos Estados do Sul (RS, SC, PR), muitos dentro dos CTGs; (ii) reconhecimento: decorrente da
aceitação vem com o tempo. Contribuíram / contribuem para isso grandes artistas
(compositores, músicos, cantores), que levaram a “música gaúcha” aos quatro
cantos do Brasil, como Teixeirinha (cerca de 80 milhões de discos vendidos),
Gaúcho da Fronteira, Renato Borghetti, Yamandu Costa, entre outros.
Os
festivais também foram e ainda são fator importante para o reconhecimento da
“música gaúcha” como expressão do tipo social do gaúcho, seu pensamento,
linguajar diferente, sotaque, etc. Além desses, os festivais estadual e
nacional promovidos pelos MTGs e CBTG valorizam, preservam e fortalecem as
raízes culturais, cujas danças
tradicionais gaúchas, músicas e letras são reconhecidas como Patrimônio
Cultural Imaterial do Rio Grande do Sul; (iii)
permanência: O “35 CTG”, criado em 1948, no dizer de Barbosa Lessa,
tratava-se de uma experiência que o tempo haveria de comprovar como válida ou
não. A “música gaúcha” deu sua importante contribuição para a validação dessa
experiência. Por isso, permanente no tempo e no espaço, alicerçada arraigada na
alma, na cultura e nos costumes dos gaúchos, há mais de cem anos. E mais, é
nossa, autêntica, sem genéricos. Conclui-se que o
tradicionalismo não vive sem suas atividades, ao contrário, depende delas. De
outro lado, a música (arte), como uma das “atividades”
do tradicionalismo (associação), é de suma importância para que este siga sua
marcha, e que se tomem os devidos cuidados em levar a autêntica “música gaúcha”
a todo o “Brasil de Bombachas”.